31.5.07

Cha de emagrecimento com PRAZO DE VALIDADE VENCIDO.

RESPONSABILIDADE CIVIL. DANO MATERIAL E MORAL. Cha de emagrecimento com PRAZO DE VALIDADE VENCIDO. indicação de funcionário da requerida. ACIDENTE DE CONSUMO. FATO DO PRODUTO. reações alérgicas provocadas com a ingestão do produto. DANO MORAL IN RE IPSA. INOCORRÊNCIA DE EXCLUDENTES DA RESPONSABILIDADE DO COMERCIANTE.
A validade do produto datava de mais de cinco anos anteriores à venda, vindo consequentemente a causar danos irreparáveis à saúde do consumidor, correta a decisão de primeiro grau que concluiu pela procedência da ação, pois evindente o acidente de consumo, por defeito do produto .
Com relação ao quantum indenizatório deverá ser adaptado aos parâmetros desta Turma.

RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.

Recurso Inominado

Primeira Turma Recursal Cível
Nº 71001048909

Comarca de Bagé
DROGARIA SAO FRANCISCO

RECORRENTE
GLACY AVILA FERREIRA

RECORRENTE
GISELDA DA SILVA MADRUGA

RECORRIDO

ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos.
Acordam os Juízes de Direito integrantes da Primeira Turma Recursal Cível dos Juizados Especiais Cíveis do Estado do Rio Grande do Sul, à unanimidade, em DAR PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO.
Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes Senhores Dr. Ricardo Torres Hermann (Presidente) e Dr. Eduardo Kraemer.
Porto Alegre, 15 de fevereiro de 2007.


DR. CARLOS EDUARDO RICHINITTI,
Relator.

RELATÓRIO
Trata-se de ação indenizatória movida por GISELDA DA SILVA MADRUGA contra DROGARIA SÃO FRANCISCO e GLACY ÁVILA FERREIRA, sustentando a autora a aquisição de medicamento com o prazo de validade expirado junto a primeira requerida. Informa a autora, que após a ingestão do referido medicamento começou a sentir náuseas e dores de cabeça, o que acarretaram sua internação hospitalar e a constatação de intoxicação medicamentosa.
A demanda foi julgada procedente para condenar as requeridas ao pagamento de 10 salários mínimos a título de danos morais e danos materiais no valor de R$ 4,88 (quatro reais e oitenta e oito centavos).
Recorrem as demandadas alegando nulidade do feito e, no mérito,pedindo a improcedência.
Subiu o recurso sendo acolhida a preliminar no sentido de afastar a revelia, por esta Turma Recursal, sendo desconstituída a decisão, para determinar o prosseguimento do feito.
Prolatada nova sentença foi o feito julgado parcialmente procedente, para condenar a ré ao pagamento e R$5.250,00, a título de danos morais. ( fls.126/130).

VOTOS
Dr. Carlos Eduardo Richinitti (RELATOR)

Merece parcial provimento ao recurso somente no tocante ao quantum arbitrado, a título de danos morais, acolhendo, como razão de decidir, no mais, integralmente a sentença recorrida, em especial no que se refere as preliminares argüidas.
Não pairam dúvidas acerca da existência de defeito do produto adquirido pela recorrida, uma vez que, estando com o prazo de validade expirado em mais de dois anos, evidente que não apresentou a segurança que dele era esperado. A medida que o comerciante oferece produto vencido aos seus clientes, correto que arque com qualquer prejuízo por estes causado.
Transcrevo decisão prolatada em caso análogo:
RESPONSABILIDADE CIVIL. DANO MATERIAL E MORAL. ALIMENTO COM PRAZO DE VALIDADE VENCIDO. PROBLEMAS ESTOMACAIS. ACIDENTE DE CONSUMO. FATO DO PRODUTO. DEVER DE QUALIDADE. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. DANO MATERIAL COMPROVADO. DANO MORAL IN RE IPSA. INOCORRÊNCIA DE EXCLUDENTES DA RESPONSABILIDADE DO COMERCIANTE. A venda de alimento com prazo de validade vencido, que causa sérios danos à saúde do consumidor, configura acidente de consumo por defeito do produto, uma vez que este não ofereceu a segurança que dele podia legitimamente se esperar. Considerando-se a aplicação do Código de Defesa do Consumidor ao caso em tela, impõe-se a responsabilização do fornecedor na forma objetiva, o que significa a dispensa da prova de culpa para restar evidenciado o dever de indenizar, bastando a existência do dano e do nexo de causalidade. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. (Recurso Cível Nº 71000857086, Primeira Turma Recursal Cível, Turmas Recursais, Relator: Ricardo Torres Hermann, Julgado em 25/05/2006)
Cabe transcrever parte do voto que elucida situação típica, como a dos autos evidenciando acidente de consumo:
“Dessa forma, a imputação da responsabilidade da recorrida, na condição de fornecedora, encontra-se determinada no artigo 18, “caput” e seu §6º, inciso I, do Código de Defesa do Consumidor, nos seguintes termos:
Art. 12 - O fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador respondem, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos.
§ 1º - O produto é defeituoso quando não oferece a segurança que dele legitimamente se espera, levando-se em consideração as circunstâncias relevantes, entre as quais:
I - sua apresentação;
II - o uso e os riscos que razoavelmente dele se esperam;
III - a época em que foi colocado em circulação.
§ 2º - O produto não é considerado defeituoso pelo fato de outro de melhor qualidade ter sido colocado no mercado.
§ 3º - O fabricante, o construtor, o produtor ou importador só não será responsabilizado quando provar:
I - que não colocou o produto no mercado;
II - que embora haja colocado o produto no mercado, o defeito inexiste;
III - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.
Art. 13 - O comerciante é igualmente responsável, nos termos do artigo anterior, quando:
I - o fabricante, o construtor, o produtor ou o importador não puderem ser identificados;
II - o produto for fornecido sem identificação clara do seu fabricante, produtor, construtor ou importador;
III - não conservar adequadamente os produtos perecíveis.
Nesse sentido os seguintes precedentes do nosso Tribunal de Justiça:
“APELAÇÃO CÍVEL. DANO MORAL. CDC. VENDA DE PRODUTO VENCIDO AO CONSUMIDOR. DENUNCIAÇÃO DA LIDE AO FABRICANTE. Responsabilidade pela venda de produto com prazo de validade vencido é do comerciante. Situação não se enquadra a nenhuma das hipóteses do art. 12 do Código de Defesa do Consumidor. Preliminar afastada. Ônus da prova não é do consumidor, pelo que não se pode exigir dele produção de provas, especialmente laboratoriais e do efetivo consumo do produto vencido. Negligência do supermercado ao não retirar das gôndolas mercadoria sem condições de consumo. Dano moral não há que ser demonstrado: em ocorrendo o ilícito, deve ser presumido. Agravo retido prejudicado. Apelo desprovido” (Apelação Cível Nº 70003736386, Sexta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Ney Wiedemann Neto, Julgado em 24/03/2004).

“APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. DANO MORAL. ALIMENTO COM PRAZO DE VALIDADE VENCIDO. PROBLEMAS ESTOMACAIS. ACIDENTE DE CONSUMO. FATO DO PRODUTO. DEVER DE QUALIDADE. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. DANO MORAL IN RE IPSA. INOCORRÊNCIA DE EXCLUDENTES DA RESPONSABILIDADE DO COMERCIANTE. QUANTUM INDENIZATÓRIO. A venda de alimento com prazo de validade vencido, que causa sérios danos à saúde do consumidor, configura acidente de consumo por defeito do produto, uma vez que este não ofereceu a segurança que dele podia legitimamente se esperar. A mais nova e moderna doutrina aponta o dever de qualidade nas relações de consumo como um dos grandes nortes instituídos pelo código de defesa do consumidor. Considerando-se a aplicação da legislação especial ao caso em tela, impõe-se a responsabilização do fornecedor na forma objetiva, o que significa a dispensa da prova de culpa para restar evidenciado o dever de indenizar, bastando a existência do dano e do nexo de causalidade. Não pode o consumidor ser responsabilizado de forma concorrente pela grave negligência praticada pelo comerciante, ao manter em suas prateleiras e comercializar produto com prazo de validade vencido há mais de vinte dias, considerando também a condição de hipossuficiente do consumidor na relação de consumo. Mesmo porque, segundo ensinamento de Carlos Roberto Gonçalves, na obra responsabilidade civil, Editora Saraiva, 2003, pág.31: `só se admite como causa exonerativa da responsabilidade a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro, não a culpa concorrente, adotando-se o mesmo sistema do decreto legislativo n. 2.681, de 1912, que trata da responsabilidade das estradas de ferro.¿ O valor arbitrado na indenização por danos morais deve atender a uma dupla finalidade: reparação e repressão. E, portanto, deve ser observada a capacidade econômica do atingido, mas também dos ofensores, de molde a que não haja enriquecimento injustificado, mas que também não lastreie indenização que não atinja o caráter pedagógico a que se propõe, razão pela qual se eleva o valor fixado em sentença para montante equivalente a 20 salários mínimos. APELO PARCIALMENTE PROVIDO” (Apelação Cível Nº 70011135241, Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Marilene Bonzanini Bernardi, Julgado em 18/05/2005).

Do corpo do segundo aresto supracitado extrai-se o seguinte ensinamento, que peço vênia à eminente relatora para transcrever:
“(...)A mais nova e moderna doutrina aponta o dever de qualidade nas relações de consumo como um dos grandes nortes instituídos pelo Código de Defesa do Consumidor. Tal dever de qualidade encontra-se visceralmente ligado à necessidade de se conferir segurança aos consumidores, notadamente em práticas relacionadas ao consumo de alimentos, como o é o caso dos autos.
Sobre o tema, vale transcrever o magistério constante na obra conjunta dos doutrinadores Antônio Hermen V. Benjamin e Cláudia Lima Marques:
“Realmente, a responsabilidade do fornecedor em seus aspectos contratuais e extracontratuais, presentes nas normas do CDC (art. 12 a 27), está objetivada, isto é, concentrada no produto ou no serviço prestado, concentrada na existência de um defeito (falha na segurança) ou na existência de um vício (falha na adequação, na prestabilidade). Observando a evolução do direito comparado, há toda uma evidência de que o legislador brasileiro inspirou-se na idéia de garantia implícita do sistema da commom law (implied warranty). Assim, os produtos ou serviços prestados trariam em si uma garantia de adequação para o seu uso, e, até mesmo, uma garantia referente à segurança que deles se espera. Há efetivamente um novo dever de qualidade instituído pelo CDC, um novo dever anexo à atividade dos fornecedores. (...)”.[1]

Ao tratar-se da segurança nas relações de consumo, não se pode perder de vista os riscos inerentes à sociedade de massa, os quais, sabe-se, são impossíveis de eliminar, cumprindo ao Poder Judiciário o difícil papel de controlá-los. Como bem salientou o doutrinador acima aludido, “o objetivo da teoria da qualidade – na vertente de proteção à incolumidade físico-psíquica do consumidor – não é reduzir todos os riscos associados com produtos ao patamar zero, já que o custo seria muito maior do que aquele que os indivíduos e a sociedade podem arcar. O que se pretende é que todos os esforços sejam encetados no sentido de assegurar que os riscos mantenham-se no limite do razoável”[2](...)”.
A responsabilidade da fornecedora, ademais, se dá de forma objetiva, haja vista a incidência do Código de Defesa do Consumidor, ou seja, desnecessária prova de culpa, bastando a existência do dano e o nexo causal para caracterizar o dever de indenizar.”
No tocante ao dano moral não resta dúvidas de que a responsabilidade do comerciante é objetiva, portanto, passível de condenação.
Contudo, no que diz respeito ao “quantum” indenizatório a título de danos morais, tenho como adequado fixá-lo em R$ 1.750,00, adequando aos parâmetros adotados por esta Turma Recursal, levando em conta, ainda, o tipo de prejuízo sofrido e a capacidade financeira da parte demandada.
Até por precaução, considerando o fato verificado, entendo conveniente oficiar-se à Secretaria da Saúde, para que o setor responsável pela Vigilância Sanitária, verifique se o estabelecimento comercial não possui outros produtos, em iguais condições.
Em face do exposto, voto no sentido de dar-se parcial provimento ao recurso, julgando parcialmente procedentes o pedido da autora, para o fim de condenar a ré ao pagamento do valor da quantia de R$ 1.750,00 (um mil setecentos e cinqüenta reais) a título de danos morais, corrigida pelo IGP-M a contar do ajuizamento da ação, incidindo sobre ambas as parcelas juros de 1% ao mês a contar da citação.
Sem sucumbência, em face do resultado.


Dr. Eduardo Kraemer - De acordo.
Dr. Ricardo Torres Hermann (PRESIDENTE) - De acordo.

DR. RICARDO TORRES HERMANN - Presidente - Recurso Inominado nº 71001048909, Comarca de Bagé: "DERAM PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO. UNÂNIME."


Juízo de Origem: 1.VARA CIVEL BAGE BAGE - Comarca de Bagé
[1] Contratos no Código de Defesa do Consumidor: o novo regime das relações contratuais. 4 ed. São Paulo: RT, 2002, p. 222.
[2] Comentários ao código de proteção ao consumidor, coordenador Juarez de Oliveira, São Paulo: Saraiva, 1991,p. 45

Marcadores: , , , , ,

0 Comentários:

Postar um comentário

<< Home