23.4.07

ação de alimentos. binômio necessidade e possibilidade. guarda compartilhada.

Evidenciado que o alimentante não dispõe de boa situação econômica, é de se manter o valor da verba alimentar fixado na decisão de primeiro grau. Da mesma forma, estando a infante sob a guarda compartilhada de ambos os genitores, a estipulação do valor dos alimentos deve levar em conta o fato de que o alimentante, além do pensionamento, possui despesas extras com a mantença da filha.
Preliminar desacolhida, diligência indeferida e apelo desprovimento.

Apelação Cível

Sétima Câmara Cível
Nº 70016686461

Comarca de Jaguarão
I.D.S.
..
APELANTE
A.P.S.
..
APELADO

ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos.
Acordam os Desembargadores integrantes da Sétima Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em desacolher a preliminar suscitada, em indeferir o pedido de diligência e em negar provimento ao apelo.
Custas na forma da lei.
Participaram do julgamento, além da signatária (Presidente), os eminentes Senhores Des. Luiz Felipe Brasil Santos e Des. Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves.
Porto Alegre, 28 de março de 2007.


DES.ª MARIA BERENICE DIAS,
Presidenta e Relatora.

RELATÓRIO
Des.ª Maria Berenice Dias (PRESIDENTa E RELATORA)
Cuida-se de apelação interposta por Ingrid D. S., inconformada com a sentença (fls. 46-51), que, nos autos da ação de alimentos ajuizada em face de Alvenir P. S., julgou parcialmente procedente o pedido, fixando a pensão alimentícia em 20% de seus ganhos.
Sustenta a apelante, em síntese, que o recorrido possui condições financeiras de arcar com a pensão postulada no montante de 40% dos seus rendimentos líquidos. Assevera que o apelado continuou residindo na casa do casal. Expõe que o Ministério Público manifestou-se pela fixação dos alimentos em 30% dos rendimentos líquidos do recorrido. Destaca que a apelante tem atualmente 10 anos de idade, sendo que as suas necessidades estão aumentando, já que logo estará na adolescência. Aduz que não houve uma avaliação profunda no que diz respeito ao binômio alimentar. Por fim, requer o provimento do recurso, para que o valor dos alimentos seja elevado para, pelo menos, um terço dos rendimentos líquidos do apelado, incidindo a verba alimentar sobre as férias e sobre o décimo terceiro salário (fls. 56-57).
O apelo foi recebido no efeito devolutivo (fl. 58).
Contra-arrazoando o recurso, o apelado, argumentando que a manifestação das fls. 27-28 foi totalmente desconsiderada, ainda que tenha sido evidenciado que a guarda da infante esteja com o ora recorrido, pugnou pela manutenção da decisão de primeiro grau (fls. 62-64).
Subiram os autos a esta Corte.
A Procuradora de Justiça opinou pelo acolhimento da preliminar suscitada ou, alternativamente, pela conversão do feito em diligência, para que seja realizado um estudo social específico, apto para apurar a situação da infante junto aos genitores, sendo depois oportunizada vista à Procuradoria de Justiça(fls. 74-78).
Foi determinada a realização de estudo social (fls. 79-82).
Cumprida a diligência (fls. 89-99), as partes, devidamente intimadas (fl. 106), deixaram de se manifestar (fl. 107).
A Procuradora de Justiça opinou pelo acolhimento da preliminar de desconstituição de sentença ou, subsidiariamente, pelo deferimento da diligência proposta, no sentido de que os autos retornem à origem, para que a representante da infante seja intimada acerca de eventual desistência da ação. Outrossim, caso outro seja o entendimento, opina pelo conhecimento e desprovimento do apelo.
A recorrente, através de petição, reiterou o pedido exarado nas razões de apelação (fl. 118).
É o relatório.
VOTOS
Des.ª Maria Berenice Dias (PRESIDENTa E RELATORA)
Inicialmente, no tocante à preliminar suscitada pelo Ministério Público, qual seja, de desconstituição da sentença, é de ser desacolhida. Isso porque, tal medida, além de protelatória, não teria qualquer efeito prático no caso. Com efeito, a informação no sentido de que o alimentante estaria com a guarda fática da infante, além de já constar no feito por ocasião da prolação da sentença, foi devidamente esclarecida, ante a realização da avaliação socioeconômica das partes envolvidas.
Assim, não havendo falar em busca da verdade real, rejeita-se a prefacial.
Igualmente, é de ser indeferido o pedido de diligência de fls. 110-112.
Pretende a douta Procuradora de Justiça o retorno dos autos à origem, a fim de que a representante da recorrente seja pessoalmente intimada, acerca de eventual desistência da ação. Tal pretensão embasa-se no fato de que, na avaliação social realizada, a genitora de Ingrid declara que pretende, através de seu representante legal, que está de férias, retornando ao trabalho, encerrar o processo, já que sua filha reside a maior parte do tempo com o réu, sendo que não mais tem interesse no prosseguimento do feito e abdica da pensão alimentícia (fls. 89-93).
Ocorre que, após apresentação do parecer ministerial, a apelante, representada pela genitora, pugnou novamente pelo provimento do apelo, não restando, assim, qualquer dúvida de que Joceli, mãe da infante, não mantém qualquer interesse na desistência do recurso.
Portanto, indefere-se a diligência requerida.
Passa-se ao exame do mérito.
Cuida-se de ação de alimentos ajuizada por Ingrid D. S., representada pela mãe, Joceli R. D., tendo o Juízo a quo, na decisão de primeiro grau, julgado parcialmente procedente o pedido, para fixar os alimentos em 20% dos rendimentos do ora apelado.
Não assiste razão à apelante.
Do exame dos presentes autos constata-se que os alimentos foram estipulados de forma proporcional, atendendo ao binômio necessidade e possibilidade.
A recorrente conta 11 anos de idade (fl. 4) e tem suas necessidades presumidas.
A genitora de Ingrid é funcionária pública municipal (exerce a função de zeladora de uma casa de passagem, percebendo mensalmente o valor bruto de R$ 428,53, fl. 95), é beneficiária do auxílio Bolsa Família (recebendo o valor de R$ 65,00) e possui outros dois filhos, Ismael e Kenyara (fl. 91). Certamente, deve contribuir para a mantença da filha, na medida das suas possibilidades.
Em relação às possibilidades do alimentante, verifica-se que Alvenir é funcionário público municipal e há cerca de dois anos recebe o auxílio-doença, no valor de aproximadamente R$ 450,00. O recorrido aluga três peças separadas da sua casa, complementando sua renda com R$ 70,00. Afirma que possui uma moto Yamaha e um automóvel Parati, ano 1984. Não possui outros filhos e, na contestação, pugna pela fixação dos alimentos em 20% dos seus rendimentos.
Efetivamente, perante o presente conjunto probatório, verifica-se que o alimentante não desfruta de boas condições econômicas para contribuir com alimentos em patamar mais elevado.
Ademais, segundo a avaliação socioeconômica familiar realizada, a infante hoje permanece sob os cuidados de ambos os genitores, residindo na maior parte do tempo com o alimentante:
(...) ela transita entre os dois núcleos familiares, sendo que em 2005 ficou sob a guarda do pai, já em 2006, por oito meses residiu com a mãe. De agosto de 2006 até o momento, está residindo com o pai. Percebe-se que, apesar de o casal não manter uma excelente comunicação, conseguem exercer a guarda compartilhada da filha Ingrid, o que se considera muito salutar ao desenvolvimento psicológico da mesma. (...) Diante do acima exposto e, levando em consideração, sobretudo, a premissa do melhor interesse da criança, nada constatamos sob o ponto de vista social, que impeça que o casal prossiga a solução já elencada anteriormente (...) acredita-se que o ideal é que ela conviva o máximo possível com ambos os genitores, sendo que esta alternância pode ser uma fórmula e uma saída para que a menor não se separe dos pais e funciona como uma possibilidade a mais para que ela ganhe uma educação mais saudável. (grifos não existentes no original)


Deve-se, portanto, ponderar que, se de um lado é extremamente saudável que o recorrido contribua com a verba alimentar - cuja fixação sequer impugnou, mesmo quando já exercia a guarda fática da infante -, de outro o valor dos alimentos, no caso, deve ser estipulado de forma a considerar que o genitor da criança, além de proporcionar à filha a pensão alimentícia, certamente possui gastos extras com a sua mantença.
A guarda compartilhada, como bem colocado pela assistente social que celebrou a avaliação das partes, proporciona aos filhos a permanência com ambos os pais e, dessa forma, torna possível um desenvolvimento mais saudável e feliz. Da mesma forma, a fixação de alimentos em tais situações, longe de onerar sobremaneira um dos genitores, tem o condão de preservar os interesses dos alimentandos.
A família das partes bem demonstra que a guarda compartilhada pode ser uma boa solução, ainda que os genitores tenham um relacionamento conflituoso.
Sobre a fixação de alimentos nos casos de guarda compartilhada, oportuno referir, como já mencionado doutrinariamente, que a guarda compartilhada não impede a fixação de alimentos, até porque nem sempre os genitores gozam das mesmas condições econômicas. Muitas vezes não há alternância da guarda física do filho e a não cooperação do outro pode onerar sobremaneira o genitor guardião. Como as despesas do filho devem ser divididas entre ambos os pais, a obrigação pode ser exigida de um deles pela via judicial. Não há peculiaridades técnico-jurídicas dignas de maior exame em matéria alimentar na guarda compartilhada, aplicando-se os mesmos princípios e regras (Manual de Direito das Famílias, 3. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006, p. 363).
Sobre o tema, o aresto desta Corte:
GUARDA COMPARTILHADA. FIXAÇÃO DE ALIMENTOS. POSSIBILIDADE. A guarda compartilhada não impede a fixação de alimentos, até porque nem sempre os genitores gozam das mesmas condições econômicas. Ademais, não mais residindo a filha com o genitor, cabível que este passe a alcançar-lhe alimentos, até porque as despesas da menina eram arcadas integralmente pelo alimentante. Agravos desprovidos. (Agravo de Instrumento Nº 70016420051, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Maria Berenice Dias, Julgado em 04/10/2006)


Destarte, inadequada se mostra a majoração dos alimentos fixados na decisão de primeiro grau.
Por tais fundamentos, desacolhe-se a preliminar e indefere-se o pedido de diligência. No mérito, nega-se provimento ao apelo.




Des. Luiz Felipe Brasil Santos (REVISOR) - De acordo.
Des. Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves - De acordo.

DES.ª MARIA BERENICE DIAS - Presidente - Apelação Cível nº 70016686461, Comarca de Jaguarão: "DESACOLHERAM A PRELIMINAR, INDEFERIRAM O PEDIDO DE DILIGÊNCIA E NEGARM PROVIMENTO AO APELO. UNÂNIME."


Julgador(a) de 1º Grau: MARCELO MALIZIA CABRAL

Fonte: TJRS

Marcadores: , ,

0 Comentários:

Postar um comentário

<< Home