2.6.07

agressão em casa noturna. seguranças. ausência de moderação. danos morais caracterizados.

RESPONSAbilidade civil. agressão em casa noturna. seguranças. ausência de moderação. danos morais caracterizados.
Evidenciado o excesso praticado pelos seguranças, prepostos da ré, ao forçarem o autor a retornar à casa noturna, obrigando-o a ali permanecer por cerca de uma hora, até a chegada da Polícia Militar que havia sido acionada.
Constrangimentos suportados pelo autor que merecem ser reparados pelo estabelecimento demandado, máxime quando sequer comprovada a acusação de que o primeiro havia quebrado o vidro da casa noturna.
APELO PROVIDO.

Apelação Cível

Décima Câmara Cível
Nº 70013512595

Comarca de São Leopoldo
EMANUEL OTTO SCHWIEDER

APELANTE
JATA CLUBE BAR E RESTAURANTE LTDA

APELADO

ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos.
Acordam os Desembargadores integrantes da Décima Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em dar provimento ao apelo.
Custas na forma da lei.
Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes Senhores Des. Paulo Antônio Kretzmann (Presidente e Revisor) e Des. Jorge Alberto Schreiner Pestana.
Porto Alegre, 16 de março de 2006.


DES. LUIZ ARY VESSINI DE LIMA,
Relator.

RELATÓRIO
Des. Luiz Ary Vessini de Lima (RELATOR)
Emanuel Otto Schwieder ajuizou ação de indenização por danos morais contra Jata Clube Bar e Restaurante Ltda., asseverando que ao sair da danceteria explorada pelo réu, enquanto caminhava na calçada, foi gravateado por um dos seguranças do demandado, sob a injusta alegação de ter quebrado o vidro do estabelecimento. Em seguida, os seguranças o levaram para dentro do bar, momento em que o jogaram ao chão, tendo desmaiado em virtude de asfixia provocada pela gravata. Historiou, ainda, que, após recobrar os sentidos, foi agredido fisicamente pelos funcionários do demandado.
A sentença, às fls. 167/177, julgou a ação improcedente, condenando o autor ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, estes fixados em R$ 600,00. Suspensa a exigibilidade dos ônus sucumbenciais, por litigar sob o pálio da AJG.
Em razões recursais, às fls. 181/200, o autor diz que a sentença deve ser reformada. Aduz que as agressões sofridas pelos seguranças do requerido restaram devidamente comprovadas, seja por meio dos depoimentos das testemunhas, seja pelo exame de corpo e delito. Menciona que não quebrou o vidro do estabelecimento. Afirma que não estava embriagado. Menciona que um dos argumentos utilizados pela julgadora a quo, qual seja, de que não houve condenação na esfera criminal, não pode ser usado como fundamentação para não se configurar a responsabilidade civil, pois é sabido que esta última independe de qualquer condenação no âmbito penal. Alega que o dano moral não necessita de prova, bastando, para tanto, a comprovação do ilícito e do nexo de causalidade. Ressalta que não fez ocorrência policial logo após o fato danoso, em virtude de seus algozes terem lhe acompanhado na Delegacia de Polícia, razão pela qual realizou este procedimento somente dois dias após o evento. Diz que foi vítima de cárcere privado, uma vez que foi mantido, durante mais uma hora e contra a sua vontade, no interior da danceteria. Entende que o requerido deve ser condenado ao pagamento de danos morais, corrigido desde a data do evento ilícito, acrescido de juros de 6% ao ano, até a entrada em vigor do novo Código Civil, e, após, de 12% ao ano, devendo os honorários advocatícios ser fixados em 20% sobre o valor da condenação. Por fim, postula o provimento do recurso.
Em contra-razões, às fls. 203/211, o réu refutou as articulações esposadas no recurso, pugnando pelo seu não-provimento.
Recebi os autos.
É o relatório.
VOTOS
Des. Luiz Ary Vessini de Lima (RELATOR)
Eminentes Colegas! Merece ser revertida a r. sentença.
Trata-se de ação de indenização por danos morais por alegadas agressões perpetradas pelos seguranças da ré ao autor.
Segundo a inicial, o demanadante ao sair do estabelecimento da primeira, quando caminhava pela calçada, por volta das 5:00h, fora abordado, modo violento, pelos seguranças da primeira que o obrigaram a retornar àquele local. A acusação era de que ele havia quebrado a vidraçaria do Bar. Referiu ainda ter sido jogado ao chão, tendo desmaiado, em virtude da asfixia.
A ré, por sua vez, afirma que o demandante não fora agredido por funcionário seu. Referiu que o primeiro ao sair do estabelecimento deu um soco na janela que acabou quebrando o vidro e quase atingiu os clientes que se encontravam no interior do bar. Como tentou fugir, os seguranças o interceptaram e o conduziram para o interior do referido estabelecimento inclusive para tratar do ferimento da mão, onde aguardou até a chegada da Polícia Militar que havia sido chamada.
Da análise do contexto probatório, verifica-se que efetivamente os prepostos da demandada desbordaram do seu mister, ao usar a força, conduzindo o autor da rua para dentro da casa noturna e obrigando-o a permanecer no local, mediante acusação que sequer chegou a ser comprovada.
Nesse passo, vale trazer excertos dos depoimentos das testemunhas, os quais evidenciam a abusividade praticada.
Fernando Knebel, repete em juízo o que já afirmara três anos antes, em seu depoimento na Delegacia ( fls. 130), dizendo que saíra da boate com o autor e em seguida vieram na direção do depoente e do autor, dois seguranças da choperia e um deles deu “uma gravata no autor” , enquanto o outro puxava um dos braços do autor para as costas. Dessa forma levaram o autor de volta ao interior da choperia, acusando-o de ter atirado uma pedra e causado a quebra do vidro da choperia”... Viu que os seguranças tentavam convencer o autor a confessar que tinha atirado uma pedra e causado a quebra do vidro da choperia. o autor respondia que não tinha sido ele e que não tinha feito nada.
Disse, ainda, que ao tentar esclarecer que o demandante não havia praticado aquele ato, ouviu dos seguranças que ele não tinha que se meter no assunto.
A testemunha Luciana, a seu turno, descreve a situação em que se encontrava o autor, naquele momento:

... viu o autor já sentado no interior da choperia, aparentado não estar passando bem, pois estava bastante pálido e parecia que ia desmaiar. Os seguranças estavam em volta dele, não deixando a depoente aproximar-se para prestar ajuda...Quando viu o autor sentado na choperia, este estava chorando e parecia estar em pânico.
Que o demandante estava contrariado com a situação restou devidamente evidenciado nos autos, até mesmo pelo depoimento da testemunha da ré, Carlos, à fl. 135v, o qual refere:

... lembra que o rapaz que foi trazido estava visivelmente irritado, chateado, em desacordo com a ação do suposto segurança... o rapaz estava bravo mas não pode afirmar que estava embriagado.

E no exame de corpo de delito está atestado: apresenta na região servical uma solução de continuidade superficial ( escoriação) com cinco milímetros por quatro milímetros


Não se desconhece que em certas situações é necessário o emprego da força, por parte desses profissionais, desde que dentro da razoabilidade, para contornar certos conflitos. Entretanto, não é o que se apresentava naquele momento.
Veja-se que não havia uma certeza que o autor havia praticado o ato que lhe era imputado, tampouco o exame de corpo de delito acusou o ferimento na mão, alegado pela ré para justificar a condução forçada da vítima, revelando-se arbitrário, portanto, o agir dos seguranças.
Vale salientar, que a ré é um estabelecimento comercial do ramo de diversão, uma casa noturna. Por óbvio que, dentre as obrigações inerentes à natureza de sua atividade, está a de garantir a segurança e incolumidade dos seus freqüentadores, o que não se verificou no caso em exame.
Esta não é a primeira vez que há condenação de casas noturnas por esse tipo de acontecimento. Ora, é cediço que tal ramo de atividade, em que se atua diretamente com pessoas, requer a contratação de profissionais preparados e habilitados para lidarem com o público e enfrentarem situações como a dos autos. A ré, ao que parece, não obedece tais preceitos, e, por isso, obviamente, deve responder pelos atos praticados pelos seus funcionários no exercício de sua função, nos termos do artigo 1.521, inciso III, do Código Civil 1916 (atual art. 932), exatamente como no caso em exame.
O dano moral também restou caracterizado, já que, além da humilhação de ser conduzido à força, ficou cerceado no seu direito de ir e vir, na frente das pessoas que ali se encontravam, inclusive conhecidos seus. Evidente, assim, a sensação de impotência frente à situação. Trata-se, pois, de hipótese do chamado dano moral puro, o qual independe de comprovação, porquanto decorrente do próprio ilícito indenizável.
Nesse sentido:

RESPONSABILIDADE CIVIL. AGRESSÕES EM CASA NOTURNA. DANOS MATERIAIS E MORAIS CARACTERIZADOS. RECONVENÇÃO. Trata-se de ação de indenização por danos materiais e morais decorrentes de agressões perpetradas por seguranças da requerida contra o autor e pelos prejuízos causados no seu carro, e reconvenção objetivando a cobrança da consumação impaga pelo autor. Situação em que restou comprovado que os seguranças da boate agiram com excesso, resultando nos chamados danos morais puros. Da mesma forma, os prejuízos materiais restaram demonstrados danos causados no carro do autor, cujo montante deve ser pago pelo preço do menor orçamento. Por outro lado, no que diz respeito ao apelo da ré, não merece provimento, pois a mesma não logrou demonstrar de onde tirou os valores cobrados, bem como que o demandante tenha deixado de pagar o que devia. PROVIDO O RECURSO DO AUTOR, NEGADO PROVIMENTO AO DA RÉ. (Apelação Cível Nº 70011279619, Décima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Luiz Ary Vessini de Lima, Julgado em 21/07/2005).

RESPONSABILIDADE CIVIL. LESÕES CORPORAIS. LEGÍTIMA DEFESA. ÔNUS DA PROVA. DANOS MORAIS. VALOR. Se o preposto do réu agrediu o autor, injustificadamente, utilizando-se de uma barra de ferro, causando-lhe lesões corporais, torna-se o demandado responsável, civilmente, pelos danos morais suportados pelo último. Legítima defesa - ausência de comprovação. A regra processual civil é de que cabe ao autor a prova dos fatos constitutivos do seu direito; e ao réu a dos fatos modificativos, impeditivos ou extintivos do direito invocado (art. 333 do CPC). APELO IMPROVIDO. (Apelação Cível Nº 70004103438, Décima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Luiz Ary Vessini de Lima, Julgado em 19/09/2002).

Caracterizado o dano e o dever de indenizar, passo a examinar o valor da reparação.
Sabe-se que, para tal devem ser consideradas a capacidade econômica das partes, evitando-se o enriquecimento injustificado de cada uma delas em detrimento da outra; o caráter pedagógico da medida, avaliando-se o grau de participação de cada litigante no evento; e, por fim, a extensão do dano.
Nesse sentido:

RESPONSABILIDADE CIVIL. JOVEM ADOLESCENTE AGREDIDO POR SEGURANÇAS DE BOATE. QUANTIFICAÇÃO DO DANO MORAL. O VALOR DA INDENIZAÇÃO DEVE SER AFERIDO DIANTE DE PARÂMETROS BALIZADORES EXISTENTES E DAS CIRCUNSTÂNCIAS DE CADA CASO, EM FACE DA SUBJETIVIDADE SEMPRE PRESENTE EM SUA QUANTIFICAÇÃO, ATENDENDO TANTO AO CARÁTER INIBITÓRIO-PUNITIVO COMO REPARATÓRIO-COMPENSATÓRIO, REPOUSANDO NUM PATAMAR DE RAZOABILIDADE. CONDENAÇÃO QUE NÃO FUGIU DESSES PADRÕES. SENTENÇA MANTIDA. APELAÇÃO DESPROVIDA. (08 FLS). (Apelação Cível Nº 70000284869, Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Rejane Maria Dias de Castro Bins, Julgado em 29/03/2000).

O autor é estudante e, ao que tudo indica, de temperamento moderado, ao passo que a ré, é estabelecimento comercial presumivelmente com boas condições econômicas, pelo que se depreende do contrato social às fls. 75 a 85. Por outro lado, os danos foram de média extensão já que a agressão física dentro do estabelecimento, na forma descrita na inicial, não logrou ser comprovada.
Diante de tal quadro, sopesadas as peculiaridades do caso concreto, fixo a indenização por danos morais em R$ 3.000,00, com correção pelo IGPM a partir deste julgamento e juros a contar da citação no percentual de 6% ao ano, até a entrada em vigor do novo Código Civil, passando então para 1% ao mês.
Caberá à demandada o pagamento das custas processuais e honorários de sucumbência que arbitro em 20% do valor da condenação, nos termos do artigo 20, §3º, do CPC.
Por todo o exposto, manifesto-me pelo PROVIMENTO do apelo, ao efeito de condenar a demandada no pagamento da importância suprareferida


Des. Paulo Antônio Kretzmann (PRESIDENTE E REVISOR) - De acordo.
Des. Jorge Alberto Schreiner Pestana - De acordo.

DES. PAULO ANTÔNIO KRETZMANN - Presidente - Apelação Cível nº 70013512595, Comarca de São Leopoldo: "DERAM PROVIMENTO AO APELO. UNÂNIME."


Julgador(a) de 1º Grau: ISABEL FORTES BLAUTH

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