6.6.07

APELAÇÃO CÍVEL. SEGURO OBRIGATÓRIO (DPVAT).

Apelação Cível nº 70010706646 – 6ª Câmara Cível – Porto Alegre
APELAÇÃO CÍVEL. SEGURO OBRIGATÓRIO (DPVAT).
Invalidez permanente. Aplicável a Lei nº 6.194/74 ao Seguro Obrigatório de Danos Pessoais Causados por Veículos Automotores de Via Terrestre (DPVAT), que não foi revogada pelas Leis nos 6.205/75 e 6.423/77 no que se refere ao critério de fixação da indenização. Indenização correspondente a 40 salários mínimos. Art. 3º, b, da Lei nº 6.194/74. Ausência de distinção quanto ao grau da invalidez.
DESPESAS MÉDICAS.
Não comprovado especificamente a quais despesas com tratamento se refere o recibo juntado aos autos, descabe o ressarcimento do valor pleiteado.
RECURSO ADESIVO.
Juros de mora. Termo a quo. Citação. Art. 219 do CPC. Responsabilidade contratual. Correção monetária desde o evento danoso. Apelo provido em parte, e negado provimento ao recurso adesivo.
Heloísa dos Santos Lemos, apelante-recorrida adesiva – Porto Seguro Cia. de Seguros Gerais, recorrente adesiva-apelada.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos. Acordam, os magistrados integrantes da 6ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, dar provimento em parte ao apelo e negar provimento ao recurso adesivo. Custas na forma da lei.
Participaram do julgamento, além do signatário (Presidente), o eminente Sr. Des. Ubirajara Mach de Oliveira (Revisor) e o eminente Sr. Dr. José Conrado de Souza Júnior.
Porto Alegre, 23 de fevereiro de 2006.
Antônio Corrêa Palmeiro da Fontoura, Presidente e Relator.
RELATÓRIO
Des. Antônio Corrêa Palmeiro da Fontoura (Presidente e Relator) – Trata-se de apelação cível interposta por Heloísa dos Santos Lemos em face da sentença das fls. 154-157, que julgou procedente em parte o pedido formulado na ação de cobrança de DPVAT movida contra Porto Seguro Cia. de Seguros Gerais para condenar a requerida ao pagamento do valor de R$ 2.127,51 corrigido monetariamente desde a data do evento danoso (30-07-99) com incidência de juros de mora de 01% a contar da citação. Condenou, ainda, em custas por metade entre as partes e em honorários advocatícios ao procurador da parte-autora, fixados em 15% do valor da condenação, e ao procurador da requerida em R$ 400,00, admitida a compensação entre as verbas honorárias, ainda que a autora seja beneficiária da gratuidade da justiça.
Em suas razões (fls. 160-166), insurgiu-se em face da aplicação da Resolução do CNSP, sustentando tratar-se de norma hierarquicamente inferior às Leis Federais nos 6.194/74 e 8.441/92, que regem o seguro obrigatório e determinam que, em caso de invalidez permanente, o valor da indenização seja de 40 salários mínimos, e não R$ 6.754,01. Alegou que a documentação acostada comprova o definitivo déficit funcional da autora. Referiu que para o pagamento do valor postulado pela apelante basta a comprovação do infortúnio, demonstração das seqüelas e comprovante de despesas médicas caso as tenha.
Ressaltou terem sido comprovados os procedimentos efetuados por meio de recibo médico devidamente assinado. Afirmou que a lei tão somente refere que a indenização é de até 40 salários mínimos, sendo descabido o cálculo de 45% de 70, sugerido pela apelada e acolhido pelo magistrado de 1º grau. Salientou haver posição pacífica e unânime no Superior Tribunal de Justiça a respeito da possibilidade de vinculação da indenização do seguro obrigatório ao salário mínimo. Requereu o provimento do recurso com a reforma da sentença monocrática.
Apresentadas contra-razões pela Seguradora às fls. 168-178. Interposto recurso adesivo (fls. 179-183), requereu a reforma parcial da sentença com relação ao termo a quo de incidência da correção monetária. Asseverou que o cálculo da correção monetária deve levar em consideração, como divisor, o índice de atualização vigente no mês do ajuizamento da ação, sob pena de afronta à Lei nº 5.899/81 e ao Decreto nº 86.649/81, os quais prequestiona expressamente. Requereu o provimento do recurso determinando a incidência de juros a contar do ajuizamento.
Oferecidas contra-razões pela autora (fls. 190-195), subiram os autos a este Egrégio Tribunal de Justiça, distribuídos para a 12ª Câmara Cível, esta entendeu por declinar da competência para uma das Câmaras integrantes do Terceiro Grupo Cível. Redistribuídos os presentes autos, vieram-me conclusos para julgamento. É o relatório.
VOTO
Des. Antônio Corrêa Palmeiro da Fontoura (Presidente e Relator) – Trata-se de ação de cobrança de seguro DPVAT em razão da ocorrência de acidente de trânsito sofrido pela autora, do qual resultaram lesões que a incapacitaram parcialmente para o trabalho. Adianto que meu voto é no sentido de dar provimento em parte ao recurso da autora e de negar provimento ao recurso adesivo. De início, cumpre referir que a questão da aplicação da Lei nº 6.194/74 é pacífica nesse Colegiado, porquanto a referida Lei não foi revogada pelas Leis nos 6.205/75 e 6.423/77, uma vez que o salário mínimo está sendo adotado como critério de cálculo do valor indenizatório, e não como fator de correção.
Assim traz a nota ao art. 3º da Lei nº 6.194/74 no Código Civil, de Theotonio Negrão, in verbis: "Art. 3º: 2. Súmula nº 37 do 1º TASP: ‘Na indenização decorrente de seguro obrigatório, o art. 3º da Lei nº 6.194/74 não foi revogado pelas Leis nos 6.205/75 e 6.423/77 (revogada a Súmula nº 15)’ p. 1.042".
Nesse sentido, precedentes dessa Câmara enunciam que são perfeitamente aplicáveis ao caso concreto as disposições da Lei nº 6.194/74, razão pela qual a indenização securitária deve observar o valor do salário mínimo nela constante.
"Apelação cível. Ação de cobrança. Seguro obrigatório DPVAT. Invalidez permanente por acidente. Aplicação do disposto no art. 3º da Lei nº 6.194/74. Comprovada a invalidez permanente por acidente, devida a indenização securitária, conforme parâmetros fixados no art. 3º da Lei nº 6.194/74. As Leis nos 6.205/75 e 6.423/77 não revogaram o critério de fixação da indenização com base no valor do salário mínimo, quer pelo marcante interesse social e previdenciário desta modalidade de seguro, quer por estabelecer a Lei nº 6.194/74 um simples critério de cálculo de valor indenizatório, não se constituindo no fator de correção monetária que as leis supervenientes buscaram afastar. Juros legais da citação. Os honorários advocatícios devem ser condizentes com o trabalho exigido e produzido pelo profissional, de modo a evitar o aviltamento da profissão. Apelo desprovido." (AC nº 70011808003, 6ª Câmara Cível do TJRGS, Rel. Des. Cacildo de Andrade Xavier, julgada em 24-08-05.)
"Seguro obrigatório. DPVAT. Quitação parcial dos valores. Efeitos. Prescrição. Inocorrência. Pagamento da diferença devida. I – Prescrição. Não se consumou prescrição, que, no caso, se houvesse, seria a do art. 177 do CC/16, vintenária. Inaplicável o disposto no art. 206, § 3º, inc. IX, do atual CC, sequer vigente à época do sinistro. II – Quitação. Efeitos. Diferença de indenização. O recibo de quitação passado de forma geral à seguradora não inviabiliza a pretensão de eventuais diferenças devidas. Entendimento pacificado do Superior Tribunal de Justiça. III – Valor da indenização. Prevalência da Lei nº 6.194/74 sobre resoluções administrativas. Princípio da reserva legal. O seguro obrigatório (DPVAT), no caso de danos pessoais, deve corresponder a 40 salários mínimos nacionais, sem que isso importe violação das Leis nos 6.205/75 e 6.423/77, ou do art. 7º, inc. IV, da CF/88. Precedente da 2ª Seção do Superior Tribunal de Justiça. Apelo desprovido." (AC nº 70012310207, 6ª Câmara Cível do TJRGS, Rel. Des. Ubirajara Mach de Oliveira, julgada em 17-08-05)
No mesmo sentido dos referidos acórdãos está assentada a jurisprudência do Egrégio Superior Tribunal de Justiça: "Civil. Seguro obrigatório (DPVAT). Valor quantificado em salários mínimos. Indenização legal. Critério. Validade. Lei nº 6.194/74. I – O valor de cobertura do seguro obrigatório de responsabilidade civil de veículo automotor (DPVAT) é de 40 salários mínimos, assim fixado consoante critério legal específico, não se confundindo com índice de reajuste e, destarte, não havendo incompatibilidade entre a norma especial da Lei nº 6.194/74 e aquelas que vedam o uso do salário mínimo como parâmetro de correção monetária. II – Recurso especial não conhecido". (REsp nº 153.209-RS, 2ª Seção do STJ, Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, julgado em 22-08-01.)
Com relação ao valor pago a título de indenização, a Lei nº 6.194/74 estabelece, em seu art. 3º, b, assim disposto: "Art. 3º – Os danos pessoais cobertos pelo seguro estabelecido no art. 2º compreendem as indenizações por morte, invalidez permanente e despesas de assistência médica e suplementares, nos valores que se seguem, por pessoa vitimada: [...] b) até 40 vezes o valor do maior salário mínimo vigente no País – no caso de invalidez permanente".
Dispõe o art. 5º da mencionada Lei que "o pagamento da indenização será efetuado mediante simples prova do acidente e do dano decorrente, independentemente da existência de culpa, haja ou não resseguro, abolida qualquer franquia de responsabilidade do segurado".
É fato incontroverso o acidente de trânsito sofrido pela apelante e o nexo de causalidade existente entre este e a redução na capacidade laboral do membro inferior direito da autora.
O laudo pericial das fls. 131/133 informa que "a periciada apresenta fratura importante de porção distal de fêmur direito com traço articular há mais ou menos 05 anos. Pelos exames acostados existe a colocação de uma placa angulada com fixação de parafusos. [...] Concluímos uma redução na capacidade laboral do membro inferior direito de 45%, basea-do na Tabela DPVAT".
Dessa forma, não há falar em indenização sobre o percentual de 70% de R$ 6.754,01, porquanto aplica-se ao caso em tela a Lei nº 6.194/74, não revogada pela Lei nº 8.441/92, a qual tem plena prevalência diante da referida Resolução do CNSP, contrariamente ao sustentado pela demandada, tese esta acolhida pelo juízo a quo.
Assim, entendo devido o pagamento do seguro DPVAT no valor correspondente a 40 salários mínimos, nos termos do dispositivo legal acima referido, porquanto este não faz distinção entre invalidez parcial ou total.
Nesse sentido, cito os seguintes julgados desse Tribunal de Justiça: "Apelação cível. Ação ordinária de cobrança. Seguro obrigatório de veículo. DPVAT. Comprovados o fato gerador, o dano e o nexo causal. Indenização devida. Comprovado o caráter definitivo da invalidez, que seja a redução dos movimentos de flexão, extensão e abdução do tornozelo, a indenização deve ser paga da forma como determinado em lei. É válida a fixação do montante em salários mínimos vigentes à época do pagamento, acrescidos de juros legais a contar da data do evento, sendo inviável a limitação da indenização com base em resolução do Conselho Nacional de Seguros Privados, por ter sido editada posteriormente e por contrariar expressa disposição de lei. Nulidade de cerceamento da ampla defesa em virtude da não--realização de prova pericial rechaçada, pois desnecessária para caracterização da lesão permanente. Apelo desprovido". (AC nº 70010008738, 6ª Câmara Cível do TJRGS, Rel. Des. Artur Arnildo Ludwig, julgada em 09-03-05.)
"Apelação cível. Seguros. Seguro DPVAT. A quitação dada pelo segurado diz respeito somente ao valor que a seguradora entendeu devido e pago ao segurado. A quitação fornecida não impede o segurado de demandar o restante da cobertura securitária que entende como devida. Inaplicabilidade do instituto da transação. Reconhecida pelo INSS a invalidez permanente da autora para atividades laborativas, deve a seguradora proceder ao pagamento da indenização devida prevista no DPVAT. Indenização correspondente a 40 salários mínimos. Não prevalece a Portaria do CNSP. Aplicabilidade da Lei nº 6.194/74.
"Salário mínimo adotado como critério de cálculo do valor da indenização, e não como fator de correção. Possibilidade. O salário mínimo é usado só para fixar o valor inicial da indenização, cuja correção monetária será pelos índices oficiais, como o IGP-M. A indenização correspondente a 40 salários mínimos deve levar em conta o salário mínimo vigente à época do evento, computando-se daí por diante a correção monetária pelo IGP-M. Pedido de minoração da verba honorária. Descabimento. Valor justo e adequado. Manutenção dos honorários advocatícios fixados em sentença. Quantia que atende ao grau de zelo do profissional, o lugar da prestação do serviço, a natureza e importância da causa, o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço. Apelo parcialmente provido." (AC nº 70010646065, 6ª Câmara Cível do TJRGS, Rel. Dr. Ney Wiedemann Neto, julgada em 24-11-05)
"Seguro obrigatório de veículo. DPVAT. Invalidez permanente. De acordo com a redação do art. 5º da Lei nº 6.194/74, dada pela Lei nº 8.441/92, o pagamento da indenização está condicionado apenas à prova do acidente e do dano decorrente. Outrossim, comprovada a invalidez permanente, o valor da indenização deve corresponder a 40 vezes o salário mínimo vigente, porquanto a alínea b do art. 3º da Lei nº 6.194/74 não faz diferença quanto ao grau da invalidez. Fixação da indenização em salários mínimos como critério de cálculo. Despesas médicas que também devem ser reembolsadas, porquanto devidamente comprovadas. Correção monetária e juros de mora, incidentes sobre a quantia reembolsável, contados desde a citação. Apelo desprovido." (AC nº 70013105937, 5ª Câmara Cível do TJRGS, Rel. Des. Leo Lima, julgada em 14-12-05)

Com relação ao pedido de ressarcimento das despesas médicas no valor de R$ 678,00 conforme comprovante da fl. 31, entendo que não prospera o recurso.
Do exame de tal documentação, verifico que tal recibo não especifica o tratamento realizado pela demandante, descrevendo tão-somente "tratamento consulta c/ retorno". Ademais, depreende-se do exame dos autos que tal recibo diz respeito aos honorários médicos em razão da confecção do laudo pericial da fl. 32, não estando, dessa forma, abrangido pelo art. 3º, alínea c, da Lei nº 6.194/74.
Nesse sentido o entendimento jurisprudencial das Câmaras integrantes do 3º Grupo Cível: "Apelação cível. Ação de cobrança de seguro obrigatório DPVAT. Invalidez permanente para o exercício laboral anteriormente praticado, comprovada por laudo pericial. Cabíveis 40 salários mínimos a título de invalidez permanente. Despesas médicas não comprovadas. Impossibilidade de ressarcimento por gastos não comprovados. Valor da indenização fixado à data do sinistro, corrigido pelo IGP-M. Juros moratórios de 01% ao mês a partir da citação. Apelo do autor parcialmente provido. Apelo do réu desprovido". (AC nº 70010078855, 6ª Câmara Cível do TJRGS, Rel. Dr. Ney Wiedemann Neto, julgada em 15-12-05.)
"Ação de cobrança. Seguro obrigatório – DPVAT. Acidente de trânsito. Despesas médicas. Ausência de comprovante. Somente estão abrangidos na rubrica despesas médicas e suplementares, cobertos pela Lei nº 6.194/74, os remédios, com a respectiva receita, consultas médicas, fisioterapia e demais atendimentos que se fizerem necessários à recuperação da vítima do acidente envolvendo veículo automotor. Apelo desprovido." (AC nº 70011634334, 5ª Câmara Cível do TJRGS, Rel. Des. Umberto Guaspari Sudbrack, julgada em 29-09-05.)
Isso posto, dou provimento em parte ao apelo.
Do recurso adesivo. Quanto ao termo inicial dos juros de mora, correta a sentença recorrida, porquanto se trata de ilícito decorrente de contrato, devendo, nesse caso, os juros de mora ser fixados a partir da citação, conforme o art. 219 do CPC. No que tange à correção monetária, esta visa tão-somente a recompor o valor da moeda, devendo, assim, vigorar desde o efetivo prejuízo, não merecendo qualquer reforma a sentença neste aspecto.
Dispositivo. Diante do exposto, condeno a demandada ao pagamento do valor correspondente a 40 salários mínimos vigentes à data do sinistro, em 30-07-99, corrigido monetariamente pelo IGP-M desde aquela data, acrescido de juros de mora, de 01% ao mês, nos termos do art. 406 do CC, c/c o art. 161, § 1º, do CTN, devido a partir da citação, nos termos do art. 219 do CPC.
Em face do decaimento mínimo da autora, condeno a demandada ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios devidos ao patrono da parte adversa, fixados em 15% sobre o valor da condenação, a teor do disposto no art. 20, § 3º, do CPC, tendo em vista o trabalho desenvolvido pelo profissional. É o voto.
Des. Ubirajara Mach de Oliveira (Revisor) – De acordo.
Dr. José Conrado de Souza Júnior – De acordo.

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