22.5.07

Casal deve ser indenizado por falha de pacote turístico em viagem de lua-de-mel

APELAÇÃO CÍVEL. DANOS MORAIS. INDENIZATÓRIA. LEGITIMIDADE PASSIVA.
É parte legítima para figurar no pólo passivo de demanda indenizatória a agência de viagem que vende pacote turístico, máxime quando os problemas apontados decorrem da atuação da guia por ela eleita.
Devidamente comprovados os transtornos e a frustração do casal em lua de mel, desassistidos pela Guia, indicada pela demandada, em País de língua não dominada pelos primeiros, resta caracterizada a falha do serviço, incidindo o art. 14 do CDC .
APELO PROVIDO. PRELIMINAR AFASTADA, IMPROVENDO-SE O AGRAVO RETIDO.

Apelação Cível

Décima Câmara Cível
Nº 70016573495

Comarca de Porto Alegre
EZIO TEIXEIRA

APELANTE
CLAUDIA CORREA MELLO TEIXEIRA

APELANTE
AGENCIA DE VIAGENS CVC TURISMO LTDA

APELADO

ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos.
Acordam os Desembargadores integrantes da Décima Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em, afastada a preliminar, dar provimento ao apelo, improvendo-se o agravo retido.
Custas na forma da lei.
Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes Senhores Des. Paulo Antônio Kretzmann (Presidente) e Des. Paulo Roberto Lessa Franz.
Porto Alegre, 26 de outubro de 2006.


DES. LUIZ ARY VESSINI DE LIMA,
Relator.

RELATÓRIO
Des. Luiz Ary Vessini de Lima (RELATOR)
EZIO TEIXEIRA e CLÁUDIA CORREA MELLO TEIXEIRA, ajuizaram ação indenizatória de danos materiais e morais contra AGÊNCIA DE VIAGENS CVC TURISMO LTDA, objetivando a condenação da ré ao pagamento de verba indenizatória pelos danos morais sofridos no valor correspondente a dez vezes o valor dos gastos na viagem.
Na inicial (fls. 02-20) os demandantes relataram que contrataram com a demandada viagem a Ilha de Aruba, para passarem a sua “lua de mel”, em razão da realização do casamento realizado no dia 27/11/2004, por meio de pacote turístico que incluíam passagens aéreas, hotel, guia turístico e várias atividades. Referiram que a requerida deixou de prestar uma das atividades que fazia parte do pacote de turismo, representada pela possibilidade de os requerentes utilizarem guia de turismo para lhes prestar assistência no país estrangeiro, o que não aconteceu em nenhum momento, ficando estes ao total abandono. Informaram que uma das atividades contratadas, denominada de “noite mexicana”, não se realizou devido a alterações no roteiro que não foram comunicadas pela guia, Sra. Maria José, que somente atendeu aos insistentes telefonemas dos autores no dia do embarque de retorno a Porto Alegre. Disseram que a Sra. Maria José também deixou de entregar cupons de descontos em estabelecimentos comerciais que haviam sido pactuados. Por fim, salientaram que suportaram grave abalo moral. Pugnaram pela procedência da ação.
Contestando (fls. 65-103), a ré aduziu, preliminarmente, a inépcia da inicial, por não vislumbrar os alegados danos morais em montante compatível com a gravidade do ilícito praticado. Alegou não haver qualquer referência à pretensão dos autores quanto aos danos materiais. Ainda em preliminar, alegou ser parte ilegítima para a causa, uma vez que os serviços contratados pela demandada foram todos cumpridos, inexistindo relação comercial entre a ré e a empresa de promoção de passeios (Maria Bonita Representaciones), da qual teriam os autores adquirido os passeios diretamente na ilha, não fazendo parte do pacote contratado entre os demandantes e a demandada. No mérito, referiu que todos os serviços contratados foram realizados. Postulou a improcedência da ação ou, alternativamente a redução do valor pedido.
Irresignada, a ré interpôs agravo de instrumento contra a decisão que indeferiu a oitiva de testemunhas (fls. 139-154), subindo os autos a esta Corte foi convertido em agravo retido (fls. 158-158v).
Sobreveio sentença (fls. 160-162), a demanda foi julgada improcedente, sendo os demandantes condenados ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios fixados em R$ 1.500,00.
Apelam os autores (fls. 165-187) reiterando os argumentos lançados na petição inicial e na réplica, enfatizando que a sentença não pode usar o valor indicado, por entendê-lo excessivo, como um dos fundamentos para julgar improcedente a ação. Pleiteiam o provimento do recurso e a conseqüente procedência da ação.
A apelada apresentou contra-razões (fls. 190-229) referindo à existência de agravo retido em face do afastamento da preliminar de ilegitimidade passiva.
Recebi os autos.
O processo foi submetido à revisão.
É o relatório.
VOTOS
Des. Luiz Ary Vessini de Lima (RELATOR)
Eminentes Colegas! Entendo que deva ser revertida a r. sentença.
Passo ao exame da preliminar suscitada em contra-razões para afastá-la. É que os autos dão conta que a Sra. Maria José era a Guia Turística indicada pela demandada, como responsável pelo assessoramento dos demandantes na ilha de Aruba. E no contrato de prestação de serviço, à fl. 107, bem como no "vaucher' constam o nome daquela e seu telefone. É ela, também, pelo que se depreende do doc. à fl. 39, a proprietária da empresa Maria Bonita, da qual foram adquiridos os ingresso para os espetáculos locais, e representante da CVC. Destarte, não há como afastar a legitimidade da demandada.
Quanto ao agravo retido, diferentemente do sustentado pela apelada, não se refere à questão da ilegitimidade. A irresignação ali vertida é com a decisão a quo que indeferiu a produção de prova oral, a qual, diga-se de passagem, era desnecessária. Vai indeferido, pois.
No mérito, tem-se que, à luz do CDC, a ré efetivamente pode ser responsabilizada pelos incômodos passados pelo casal em lua de mel. Certo que a assistência de uma guia faz parte de tais pacotes turísticos, e que embora os passeios fossem contratados no local, transparece claramente, como já referido, que estes foram oferecidos por empresa participante do esquema e, inclusive contratada para o transporte aeroporto-hotel-aeroporto. De qualquer sorte, o total descaso da guia ficou evidente até pela tentativa final de acertar as coisas evitando reclamações.
Ademais, restou claro que os autores não conseguiram participar do espetáculo “noite mexicana” o qual, segundo referiram, era o que lhes despertara maior interesse. E isso em face de equívoco nos horários e dias que lhes foram fornecidos.
Por outro lado, as diversas tentativas de falar com a guia foram infrutíferas, pois seu telefone não atendia, e tal vem comprovado na declaração da Supervisora da Recepção, à fl. 25, traduzida na inicial, na qual se lê:

A quem interessar possa.
Prezados Senhores:

Quero informar-lhes pela presente que o casal Teixeira tentou entrar em contato com a Sra. Maria José (Maria Bonita Representaciones) durante toda sua estada conosco, não obtendo sucesso em contactar essa pessoa. O casal Teixeira ficou conosco no ( Hotel) Aruba Marriot & Stellamaris Casino de 29/11/04 a 06/12/04. Hoje, 06/12/04, o casal Teixeira conseguiu contactar a Dra. Maria José ( Maria Bonita Representaciones). Infelizmente tarde demais, pois não lhes foi possível participar de diversas atividades (programadas). Qualquer assistência que possam prestar ao casal Teixeira será muito apreciada. Cordiais saudações.

Dentro desse quadro, é compreensível as frustrações decorrentes da reversão de expectativas e natural desapontamento, como o relatado pelos autores a revelar o desrespeito para com o consumidor.
Resta evidente que esse desencontro, perda do passeio, onde também faltou comunicação eficiente, dificuldade de expressão na língua espanhol e/ou inglês, causou notórios danos morais decorrentes logicamente dessas circunstâncias, a serem suportados pela agência de viagem de conhecida idoneidade e, por isso mesmo, possuidora de credibilidade junto aos consumidores.
A respeito do tema em comento, traz-se a jurisprudência do STJ e desta E. Corte, a título exemplificativo:


“RESPONSABILIDADE CIVIL. AGÊNCIA DE TURISMO. PACOTE TURÍSTICO. SERVIÇO PRESTADO COM DEFICIÊNCIA. DANO MORAL. CABIMENTO. PROVA. QUANTUM. RAZOABILIDADE. RECURSO PROVIDO. I - A prova do dano moral se satisfaz, na espécie, com a demonstração do fato que o ensejou e pela experiência comum. Não há negar, no caso, o desconforto, o aborrecimento, o incômodo e os transtornos causados pela demora imprevista, pelo excessivo atraso na conclusão da viagem, pela substituição injustificada do transporte aéreo pelo terrestre e pela omissão da empresa de turismo nas providências, sequer diligenciando em avisar os parentes que haviam ido ao aeroporto para receber os ora recorrentes, segundo reconhecido nas instâncias ordinárias. II – A indenização por danos morais, como se tem salientado, deve ser fixada em termos razoáveis, não se justificando que a reparação enseje enriquecimento indevido, com manifestos abusos e exageros. III - Certo é que o ocorrido não representou desconforto ou pertubação de maior monta. E que não se deve deferir a indenização por dano moral por qualquer contrariedade. Todavia, não menos certo igualmente é que não se pode deixar de atribuir à empresa-ré o mau serviço prestado, o descaso e a negligência com que se houve, em desrespeito ao direito dos que com ela contrataram.” (RESP 304738/SP; STJ, 4ª Turma, Rel. Min. SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA, j. 08/05/2001, DJ 13/08/2001 PG:00167, LEXSTJ VOL.:00147 PG:00243).


“DANO MORAL - TURISMO - QUANDO A ESPECTATIVA DA VIAGEM SE TRANSFORMA EM GRANDE FRUSTRACAO DIANTE DA INJUSTIFICAVEL CONDUTA DO PRESTADOR DOS SERVICOS, VIAVEL O DANO MORAL. AGENCIA DE VIAGEM E OPERADORA SOLIDARIAMENTE RESPONSAVEIS. RECURSO DAS RES DESPROVIDOS, SENDO PROVIDO PARCIALMENTE O DOS AUTORES.” (APELAÇÃO CÍVEL Nº 598200848, SEXTA CÂMARA CÍVEL, TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RS, RELATOR: DÉCIO ANTÔNIO ERPEN, JULGADO EM 02/06/1999).


“AGRAVO DE INSTRUMENTO. ACAO DE REPARACAO. AGENCIA DE VIAGEM. LEGITIMIDADE PASSIVA. DENUNCIACAO DA LIDE. E A AGENCIA DE VIAGEM, PERANTE SEU CLIENTE, CONSUMIDOR, A LEGITIMIDADE PASSIVA PARA ACAO DE REPARACAO POR INSATISFATORIO SERVICO, RESGUARDADA A RE EVENTUAL REGRESSO CONTRA OUTREM, COMO A OPERADORA DE VIAGEM, A QUEM IMPUTA O ADIMPLEMENTO RUIM. AO EFEITO DE DENUNCIACAO DA LIDE, POREM, NAO SE LIVRA DE COMPROVAR, DE PRONTO, A RAZOABILIDADE DE SEU PLEITO, VALE DIZER, A EXISTENCIA DE TITULO QUE VIABILIZE, SEM PREJUIZO DO DESENVOLVIMENTO DA ACAO DO CONSUMIDOR, A INSERCAO DE ACAO CONTRA TERCEIRO. AGRAVO DESPROVIDO.” (AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 597174499, SEXTA CÂMARA CÍVEL, TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RS, RELATOR: ANTÔNIO JANYR DALL'AGNOL JÚNIOR, JULGADO EM 07/10/1997).


Destarte, como já reconhecido no caso, o abalo moral é notório não carecendo de provas confirmatórias, estando in re ipsa. O valor da indenização vai fixado em R$ 10.000,00 ( dez mil reais), corrigidos pelo IGPM a partir deste julgamento e juros legais a contar do evento lesivo, nos termos da Súmula nº 54 do STJ, importância que, no meu sentir, serve para minimizar a situação aflitiva em que se viram envolvidos pela má prestação de serviços por parte da empresa de turismo.
Por fim, no que tange ao montante pretendido, tem-se que a indicação da exordial é mera estimativa, tanto que nem foi adotada como valor da causa. E, ao contrário da ilação feita pelo julgador singular, em nada se relaciona com a correção ou não da tese dos autores.O não acolhimento desses valores, por outro lado, não acarreta sucumbência parcial (Súmula 326 do STJ).
Pelo exposto, afastada a preliminar, estou em IMPROVER o agravo retido, PROVENDO-SE o apelo, ao efeito de condenar a demandada no pagamento da importância acima referida. Sucumbente, arcará com o pagamento das custas e verba honorária de 20% sobre o valor da condenação, atendidos os critérios legais.
É o voto.



Des. Paulo Roberto Lessa Franz (REVISOR) - De acordo.
Des. Paulo Antônio Kretzmann (PRESIDENTE) - De acordo.

DES. PAULO ANTÔNIO KRETZMANN - Presidente - Apelação Cível nº 70016573495, Comarca de Porto Alegre: "PRELIMINAR AFASTADA. IMPROVERAM O AGRAVO RETIDO E PROVERAM O APELO. UNANIME."


Julgador(a) de 1º Grau: ELISA CARPIM CORREA
Fonte: Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul

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